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Agrotec

Opinião: Compromisso, resiliência e transparência - fatores de sucesso para o funcionamento da cadeia alimentar

Artigo de Opinião de Gonçalo Lobo Xavier

Diretor-geral da Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição (APED)

Ao longo dos últimos meses têm-se assistido a um contexto de grande tensão sobre a cadeia de distribuição e a alimentar em particular. Se durante a pandemia houve quem tivesse alertado para os efeitos decorrentes do período marcado pelas medidas de contingência para a contenção da Covid-19, nomeadamente, constrangimentos em segmentos industriais localizados na Ásia e nos custos do transporte internacional, o início do conflito na Ucrânia agravou de uma forma dramática o contexto economico-social vivido no continente europeu e, com outra intensidade, em Portugal.

Perante um forte aumento dos custos com a energia, combustíveis e consequente crescimento do custo dos fatores de produção, aliado à escalada da inflação para valores como não se viam há 30 anos, todo os elos da cadeia começam a ser pressionados, levando a um aumento do custo dos produtos, que acabou por ser refletido no preço final ao consumidor. Mesmo com todos os esforços que a Distribuição fez para mitigar esta situação, não transpondo para o preço ao consumidor a mesma proporção do aumento de custos recebidos dos seus fornecedores, assistiu-se a um incremento do preço dos produtos alimentares, com consequências para as famílias portuguesas. No entanto, bastava olhar para os dados divulgados por entidades independentes e credíveis – INE e Eurostat – para se observar que o índice de produtos alimentares na distribuição teve um aumento inferior ao registado nos outros elos da cadeia. Os dados são bastante concretos: em 2022 o índice de preços na produção agrícola cresceu quase 36%, o mesmo índice cresceu 31,7% na indústria agroalimentar e, no caso da Distribuição, cresceu perto de 20% no retalho alimentar.

Apesar da evidência dos dados, infelizmente, em Portugal persistiu-se em não tomar medidas concretas, preferindo ações avulsas e em alimentar a perceção que o retalho estaria a beneficiar com um contexto de dificuldade sentido pelas famílias. Nada mais injusto e desajustado em relação a um setor que representa 12,4% do PIB, que conta com mais de 144 mil colaboradores e que, nos últimos quatro anos, criou 6000 novos postos de trabalho. O tempo veio dar razão ao que a Distribuição sempre apelou – falar verdade aos portugueses – e a assinatura do pacto para a redução do IVA num cabaz de bens alimentares constituiu um passo para, finalmente, o Governo reconhecer que a solução teria de passar por diálogo e compromisso, mas também por haver um apoio concreto à produção agrícola e à indústria agroalimentar para ser possível atingir o propósito da estabilização dos preços em valor mais comportáveis.

Um mês depois da entrada em vigor da medida de aplicar IVA Zero a um cabaz composto por 46 categorias de produtos alimentares e, consequentemente, milhares de referências em loja, a Distribuição traça um balanço positivo, estando a cumprir, de forma escrupulosa, os compromissos que subscreveu. Esta é uma medida importante para as famílias, mas importa deixar claro que esta não é nem pode ser vista como a única solução para a questão do preço dos alimentos. O mercado continua a funcionar e continuam a existir variáveis, como a seca ou a peste suína, apenas para dar dois exemplos, que não são controláveis por decreto. Se é verdade que os custos com combustíveis estão a ser mais reduzidos e que a inflação está a estabilizar a março de 2023, subsistem aumentos do custo das embalagens (vidro, cartão, plástico e papel). Sem a chegada efetiva dos apoios definidos à produção, essenciais para fazer face ao acréscimo de custos dos fatores de produção, será difícil que os preços finais aos consumidores baixem e estabilizem de acordo com as expetativas de todos os atores envolvidos.

Os consumidores podem continuar a confiar na Distribuição, que estará sempre do lado da solução. Tal como foi feito para ultrapassar a pandemia, trabalhando em conjunto com a produção, a indústria agroalimentar e a logística, também agora o caminho pela conjugação de esforços para se ter uma cadeia sólida, justa e equilibrada, que vá ao encontro das famílias portuguesas. Todos precisamos e desejamos uma cadeia alimentar forte, com a produção, a indústria agroalimentar e a Distribuição alinhadas para melhor servir o consumidor que já beneficia em muito com a liberdade de escolha e com a competitividade e concorrência entre as diferentes insígnias.