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Agrotec

Produzir tomate para indústria com práticas de agricultura de conservação é viável e sustentável

A Agricultura de Conservação tem potencial para melhorar a sustentabilidade agronómica, ambiental e económica da cultura do tomate para indústria, afirmou o consórcio do projeto ‘TomAC’ ontem, Dia Mundial do Meio Ambiente, com base nos resultados do primeiro ano do ensaio que decorre num campo de produção de tomate com 12 hectares, na Lezíria de Vila Franca de Xira.

O consórcio, constituído pelo MED-UÉvora, o AG-Innov-Centro de Excelência do Grupo Sugal, a APOSOLO- Associação Portuguesa de Mobilização de Conservação do Solo e a Syngenta, está a avaliar a viabilidade da aplicação dos 3 princípios da Agricultura de Conservação (1- mínima perturbação do solo; 2- cobertura permanente do solo com plantas ou resíduos; 3-rotação e diversidade de culturas) como alternativa ao atual sistema de produção de tomate em monocultura, com intensa mobilização do solo, e solo descoberto no Inverno.

No ensaio, que decorre desde 2021 e tem a duração de quatro anos, são testados 3 sistemas de produção de tomate:

- Convencional: o tomate é produzido segundo o sistema habitual, em monocultura, mobilização intensa e solo descoberto durante o Inverno;

- TomCC: são aplicados 2 dos 3 princípios, o princípio 1 através da mobilização na linha para plantação do tomate, deixando a restante extensão de solo intacta e coberta com resíduos da cultura de cobertura (princípio 2), uma mistura de gramíneas e leguminosas semeada no outono;

- Rotação: são aplicados os 3 princípios, o princípio 1 através da mobilização do solo apenas na linha, o princípio 2 através da cultura de cobertura no Inverno, e o princípio 3 através da rotação bienal de girassol ou milho com tomate. O girassol e o milho são instalados por sementeira direta.

Os resultados do primeiro ano de ensaio, relativos ao ano agrícola 2021-2022, permitem concluir que “a utilização de uma cultura de cobertura é uma prática com interesse no sistema de produção de tomate de indústria, principalmente pela maior capacidade de produção de biomassa durante o período de outono/inverno e consequente retenção de nutrientes, nomeadamente azoto, evitando a lixiviação e permitindo manter o azoto no sistema, com potencial ganho económico na redução da fertilização”, explica Ricardo Vieira Santos, estudante de doutoramento da Universidade de Évora que realiza a sua tese no âmbito do projeto ‘TomAC’.

Sistema de rotação é o mais produtivo e ecológico

A produção de biomassa pela cultura de cobertura, a rondar as 25 ton/ha em fresco e 5 ton/ha em seco, foi cerca de 19 vezes superior comparativamente à obtida pela vegetação espontânea no sistema Convencional, com 1,3 ton/ha em fresco e 0,3 ton/ha em seco. O sistema de rotação apresentou o melhor desempenho na retenção de azoto, retendo 126 kg de azoto/ha, seguido do sistema TomCC com 91 kg azoto /ha. No sistema Convencional a flora natural apenas assimilou 5 kg azoto/ha.

As análises de solo indicam que a cultura de cobertura originou uma diminuição significativa do teor de azoto nítrico no solo, comprovando que a cultura de cobertura assimilou o azoto nos seus tecidos, protegendo-o da lixiviação.

No global, a mobilização na linha mostrou-se uma prática com potencial para instalação de tomate de indústria, em alternativa à mobilização convencional. Apesar da maior mortalidade de plântulas, a produção de tomate foi superior nos sistemas com mobilização na linha (e cultura de cobertura) face ao Convencional. O sistema Rotação obteve a maior produtividade de tomate com 110 ton/ha, um valor 31% superior ao Convencional, com 75 ton/ha. O Sistema TomCC teve uma produtividade de 92 ton/ha.

Na qualidade do tomate, verificou-se um aumento no Brix e pH e uma diminuição no teor de licopeno do tomate produzido em Conservação face ao Convencional.

Menos custos com Agricultura de Conservação

Em termos de conta de cultura, a cultura de cobertura implicou um investimento adicional de 173 €/ha com semente, operação de sementeira e destroçamento de resíduos. A mobilização na linha teve um valor de 70 €/ha, face aos 628 €/ha necessários para a preparação do solo de modo convencional.

“Somando os valores da cultura de cobertura e mobilização na linha, a alteração de práticas no sistema de produção totaliza 243€/ha, o que se traduz numa redução de 385€/ha face ao sistema de produção Convencional”, acrescenta Ricardo Vieira Santos, concluindo que “a aplicação dos princípios da Agricultura de Conservação no sistema de produção de tomate de indústria mostrou potencial para melhorar a sustentabilidade agronómica, ambiental e económica da cultura”.

O projeto ‘TomaAC’ é financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia e pela Syngenta.

Felisbela Campos, responsável de Sustentabilidade da Syngenta em Portugal, afirma: “na Syngenta acreditamos que atuando em parceria podemos caminhar mais rapidamente para criar um sistema alimentar mais sustentável na Europa, produtivo e com menos emissões, numa conjuntura de enormes desafios climáticos. O projeto ‘TomAC’ é um exemplo perfeito de cooperação baseada na Ciência ao serviço da Agricultura Regenerativa”.

Gottlieb Basch, Presidente da Federação Europeia de Agricultura de Conservação e investigador do MED-UÉvora, reconhece que “a aplicação dos princípios da Agricultura de Conservação (AC) funciona sem problemas em culturas anuais semeadas, pois existe no mercado uma vasta gama de semeadores para este fim. Porém, em culturas transplantadas extensivas a aplicação dos princípios da AC ainda se encontra numa fase muito embrionária. Assim, considero o projeto TomAC pioneiro e de extrema relevância para o desenvolvimento da AC em culturas transplantadas”.

Pedro Jiménez, coordenador do AG-Innov, considera que “a agricultura de conservação é atualmente um tema fulcral, visto que vivemos alterações climáticas constantes, escassez de recursos, e imposições políticas agrícolas que nos obrigam a olhar de forma diferente para as nossas culturas.  No AG-Innov, estamos convencidos de que este tipo de projeto reúne um conjunto de possíveis soluções para estes desafios, sejam eles a nível de melhoramento da qualidade e estrutura do solo, redução de operações e, acima de tudo, procurar alternativas sustentáveis à prática da cultura do tomate de indústria que nos permitam de forma eficiente aproveitar ao máximo os nossos recursos”.

Gabriela Cruz, presidente da APOSOLO, reconhece que “a Agricultura de Conservação (AC) é a estratégia a seguir se quisermos aumentar a produção mantendo a nossa base de recursos naturais.
Para tornar a AC uma realidade na produção agrícola, será necessário um investimento contínuo em conhecimento e experimentação aplicada, de forma a atenuar a crise hídrica agrícola, a melhorar a saúde dos solos e da qualidade da água e do ar, a adaptar-se e mitigar as alterações climáticas e a resistir a novos choques políticos, económicos e ambientais.  É igualmente necessário investir no processo de apoio à aprendizagem dos agricultores para a adoção da AC. É tudo isto que a APOSOLO espera conseguir com o projeto TomAC”.