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Agrotec

As grávidas devem consumir alimentos de origem biológica?

No outro dia, perguntaram-me se eu achava que as grávidas deveriam consumir alimentos produzidos em modo de produção biológica e, na minha opinião, sem dúvida que sim. Na produção agrícola convencional são usados diferentes produtos e é comum a presença de vestígios nos alimentos que consumimos.

Maçã

Por: Daniela Seabra, Nutricionista 0453N

Essa dose é considerada segura para o consumo humano, mas diferentes tratamentos e medicamentos são evitados durante a gravidez por não existirem provas da sua segurança para o recém- nascido. Será que existem estudos sobre a segurança de alguns agrotóxicos durante a gravidez? Eu diria que não.

Relembro que, muitas das doses consideradas atualmente seguras, são-no de acordo com a toxicologia clássica, onde é calculada a dose necessária para induzir danos em estudos celulares e animais e se calculam depois doses seguras. Não são consideradas seguras pelos novos dados, estes trazidos pelo conhecimento da toxicogenómica ou mesmo do efeito de disrupção endócrina.

Segundo estas novas áreas de conhecimento, alguns dos compostos químicos que são usados como agrotóxicos são capazes de alterar a forma como os nossos genes são lidos, influenciando a expressão genética (toxicogenómica), e alteram a forma como as nossas hormonas desempenham o seu papel no organismo (disrupção endócrina).

Um dos argumentos usados é que a dose é demasiado pequena mas, quando comparadas as concentrações destas moléculas, chegam a ser 10 a 100 vezes superiores às concentrações em que algumas das nossas hormonas circulam no nosso organismo e onde são responsáveis por inúmeras funções. Ou seja, o risco destas moléculas influenciarem a ação das nossas hormonas, nomeadamente no controlo do desenvolvimento intra-uterino, é um risco bem real.

Sabe-se hoje que a placenta não é capaz de filtrar muitos destes compostos, existindo já diferentes estudos que revelam a presença de pesticidas no cordão umbilical, no mecónio, no sangue do bebé e no líquido amniótico. Isto significa que, as mesmas moléculas que circulam no sangue em concentrações semelhantes às concentrações das nossas hormonas, são então capazes de atravessar a placenta e chegar ao feto, podendo, assim, influenciar a forma como ocorre o desenvolvimento deste novo ser.

Na ausência de estudos caso controlo (por ser eticamente reprovável), os únicos estudos possíveis são os epidemiológicos e os estudos animais/celulares. Nesses, os resultados são alarmantes. Do ponto de vista epidemiológico, já foram encontradas associações entre a proximidade de campos agrícolas e o aumento significativo de malformações; alterações do neurodesenvolvimento (como autismo); cancros infantis variados e alterações do sistema imune.

Houve mesmo quem associasse a dada colocação dos agrotóxicos com o tempo de gestação e proximidade dos campos agrícolas e o resultado foi o esperado. Os maiores danos parecem ocorrer quando a exposição a pesticidas acontece no primeiro trimestre (altura de maior vulnerabilidade para o feto) e nas grávidas que moravam mais perto destes mesmos campos.

Em 2011, a Academia Americana de Pediatria começou a manifestar a sua preocupação mas, desde aí, centenas de agrotóxicos e até novos químicos foram lançados para o ambiente – onde os agrotóxicos são apenas uma pequena parte.

Será que precisamos realmente de ainda mais provas para dizer a uma grávida que deve preferir uma maça biológica a uma maça que possa conter agrotóxicos? Pessoalmente, acho que não.

Artigo originalmente publicado na Agrotec 35