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Agrotec

Algarve tem a maior plantação de abacates da Europa

São 76 hectares de terreno, em Lagos e um investimento que ronda 1,3 milhões de euros. Totalidade da produção terá como destino o mercado internacional, através de uma cooperativa espanhola com sede em Málaga.

abacate

As primeiras árvores foram plantadas há um ano. Em 35 dias, 21 mil pequenos abacateiros mudaram a paisagem de Bensafrim, em Lagos. A CITAGO é «uma empresa familiar» de Benafim, concelho de Loulé, gerida pelos irmãos Luís e Paulo Gonçalves, respetivamente de 46 e 32 anos, fundada em 2006.

Além da recente aposta nos abacates, há muitos anos que a família Gonçalves se dedica à produção de citrinos e emprega atualmente 12 pessoas a tempo inteiro.

«O consumo de abacate está em crescimento a nível mundial e o Algarve tem um enorme potencial», justifica Luís Gonçalves. «Em Portugal estamos agora a descobrir todos os benefícios desta fruta. A procura é grande e acredito mesmo que pode ser uma mais-valia para a região».

Os irmãos encontraram em Lagos as condições ideais para desenvolver esta plantação: o tipo de solo, clima e água em abundância. «Queríamos apostar numa nova cultura em extensão e surgiu a oportunidade deste terreno», conta ao «barlavento».

Os pequenos abacateiros, de origem mexicana, provieram de viveiros autorizados de Espanha. Luís Gonçalves estima que a primeira colheita deverá ser feita três anos a contar da data da primeira plantação, ou seja, em dezembro de 2019. A produção estimada é 10 toneladas anuais por hectare.

Para já, o objetivo é que as jovens árvores «atinjam três metros e meio de altura», embora, na verdade «possam crescer mais de uma dezena de metros».

Esta é uma plantação de agricultura moderna e que já germinou até uma inovação. Os irmãos Gonçalves desenvolveram um software específico para gerir esta cultura. «Permite-nos saber minuto a minuto o que esta a acontecer», através de sensores avaliam parâmetros como a temperatura do ar, do solo, e a humidade percentual, entre outras variáveis críticas.

«Assim, por exemplo, regamos apenas o que é necessário e gastamos o essencial. O sistema permite-nos otimizar o consumo de água. Se dissermos que no pico de agosto gastamos apenas seis litros de água por árvore por dia, ninguém acredita. Reduzimos custos, mas sobretudo a pegada ambiental, o que para nós é muito importante. Comparando com o desperdício e as perdas de outras culturas, é mesmo muito pouco», sublinha.

No entanto, é também necessária uma ajuda da natureza. A médio prazo serão implantadas 300 colmeias no terreno, pois as abelhas são fundamentais para a polinização dos abacateiros. A ideia dos empresários é disponibilizar espaço a apicultores interessados em colaborar no projeto.

A CITAGO irá concentrar a produção em duas variedades, a Hass e a Bacon, e reserva para o futuro a possibilidade de expandir a área de cultivo em mais 45 hectares.

Intervenção no terreno

Antes de a paisagem estar geometricamente pontilhada com abacateiros, existiam alfarrobeiras, figueiras, sobreiros e pinheiros mas sobretudo «muito mato seco». «Mantivemos toda a parte florestal, até porque estas árvores são protegidas por lei e nós fazemos questão de as manter. Grande parte do terreno já tinha uso agrícola, apesar de estar abandonado há mais de 20 anos.

O Instituto da Conservação da Natureza e Florestas (ICNF) concedeu-nos um parecer positivo, fizemos uma limpeza e retirámos apenas árvores mortas», refere Luís Gonçalves ao «barlavento».

Do outro lado da estrada que atravessa a propriedade, que ainda não foi ocupada com nenhuma plantação mas faz parte da área adquirida pelos Gonçalves, é possível vislumbrar o tipo de vegetação densa e selvagem que antes ocupava toda a zona. «É uma mais-valia porque passa a ser uma área limpa, cuidada e vigiada, evitando-se incêndios», refere.

100 por cento dos abacates serão exportados para Espanha

«Temos a parte comercial assegurada na totalidade pela cooperativa agrícola TROPS, de Málaga, da qual somos associados. Em Portugal, apesar de existirem compradores, não há ninguém que nos possa garantir o escoamento, ou oferecer as condições e o apoio técnico que os espanhóis disponibilizam aos produtores», sublinha Luís Gonçalves.

A cooperativa providencia ações de formação e jornadas técnicas, e os especialistas espanhóis vêm com regularidade a Portugal visitar a produção algarvia. A cooperativa convida também a CITAGO a visitar os campos de outros produtores. «São excelentes. Dão todo o acompanhamento e dispõem de um gabinete de investigação onde desenvolvem estudos no sentido de otimizar as produções. Somos produtores, não nos queremos envolver com a parte comercial».

O preço médio de venda em banca para o consumidor final deverá rondar «os 4 e os 5 euros por quilo».

No total, o investimento para este projeto a três anos ronda os 1,3 milhões de euros, cofinanciado em cerca de 35 por cento por fundos comunitários. «Tivemos que ir à banca e pedimos um empréstimo. Se entretanto os fundos vierem, então, iremos amortizar. Até lá, não contamos muito com isso».

A CITAGO também produz citrinos, o principal produto que tem vindo a manter ao longo dos anos. «Temos uma produção anual de cerca de 3500 toneladas de citrinos, distribuídos por 120 hectares, sobretudo no concelho de Loulé mas também de Albufeira». No Algarve «estimo que haja hoje um total de 500 hectares dedicados à produção de abacates. Nós temos a maior plantação da Europa. E o sucesso não é só nosso… é da região e do país».

Abacate não é «eucalipto da fruta» garante Fernando Severino

No início de agosto, a notícia do abate de 17 hectares de pomar tradicional de sequeiro, em Santo Estêvão, no concelho de Tavira, com o objetivo de aí se instalar uma exploração intensiva de abacate, lançou o alarme sobre a aposta neste fruto. Até a associação ambientalista Almargem lançou uma nota de contestação.

Contactado pelo «barlavento», Fernando Severino, diretor regional de Agricultura e Pescas do Algarve, desdramatiza a recente má fama da planta. «O abacate é tanto uma espécie de eucalipto da fruta como são os citrinos, porque ambos em termos técnicos estão quase em paralelo no Algarve», compara, pois hoje há mais de 500 hectares de abacateiro plantados na região.

«Há áreas onde temos que preservar o pomar tradicional de sequeiro como unidade paisagística. Por exemplo, em certas zonas ao redor da Ria Formosa, em certas áreas típicas do barrocal. Deveria ser própria a região a preservar uma identidade regional», diz.

No entanto, «para avançarmos com a fruticultura, temos de mexer no pomar tradicional e há espaço para tudo. As alfarrobeiras são arrancadas para dar lugar a outras culturas, quer seja abacate, quer seja citrinos. Mas a verdade é que também se está a plantar olival e alfarrobeiras, entre outras fruteiras. A única coisa que não se está a plantar tanto são amendoeiras. É uma árvore que ao fim de 80/ 90 anos está morta, e isso é a maior parte do que hoje vemos na paisagem algarvia».

Ainda sobre o polémico caso, o diretor esclarece que, «de uma forma geral, as novas plantações de abacate pedem um parecer à Direção Regional de Agricultura. Foi o que aconteceu em Santo Estêvão.

O abate de oliveiras estava devidamente acautelado. Cada vez que são ultrapassadas determinadas densidades, a legislação obriga os produtores a plantar olival, noutros locais, em substituição».

Questionado sobre o interesse no abacate, Severino explica que «é utilizado na gastronomia, na indústria cosmética e até em produtos farmacológicos. Cada vez são mais as aplicações e a procura está aumentar».

De tal modo, que o diretor regional confirma que há «uma grande procura de terrenos. Não nos podemos iludir. Temos um clima que é invejado por toda a gente. O abacate só cresce numa parte específica do mundo, nestas áreas temperadas, abrigadas das geadas. Há quem venha à procura de 600 hectares e mais para produzir. Isso não existe no Algarve. No máximo, encontram entre 10 a 30 hectares e esta cultura está a avançar assim».

Fernando Severino também vê com bons olhos o papel da cooperativa de Malága, embora ainda não a tenha visitado. «Esse intercâmbio tem sido positivo, porque senão ninguém teria avançado com estas centenas de hectares de abacate que estão a ser plantadas. Em termos mundiais há uma falta de produto de tal maneira que os viveiros já estão a demorar dois ou três anos a conseguir arranjar plantas para o Algarve». Em termos de lucro, comparativamente aos frutos vermelhos, por exemplo, «ainda é cedo para saber. Agora, com estas novas plantações que estão a ser feitas e com o igual esforço de investimento dos espanhóis, o preço há de estabilizar. Só nessa altura poderemos fazer uma avaliação global mais rigorosa».

Cultura amiga do ambiente?

Segundo Fernando Severino, diretor regional de Agricultura e Pescas do Algarve, «o abacate no Algarve tem muito poucas doenças e pragas. A quantidade de pesticidas utilizada é mínima e quase nula nalguns casos». Em relação à produção da CITAGO, em Lagos, «está numa zona isolada, e por isso não tem quaisquer problemas fito-sanitários».

O responsável admite mesmo que pode ser considerada uma produção modelo na região. «Esse tipo de árvore e nas condições referidas, requer menos quantidade de água que um pomar de citrinos.

Em Lagos, têm um sistema computorizado e de precisão que apenas dá à planta o que ela precisa. É um consumo mínimo de água e de adubos. Na maior parte dos nossos pomares, ainda não conseguimos levar a tecnologia tão longe. O futuro vai ser esse. Não conseguimos ainda porque nem os nossos agricultores, nem os equipamentos estão preparados para isso, mas havemos de lá chegar».

Em relação a novas culturas, o responsável revela que há interesse no figo fresco, «um mercado excecional», continuação da plantação de citrinos, medronheiros, ornamentais, floricultura , uma grande aposta na apicultura e uma crescente na agricultura biológica.

«No Algarve, o número de explorações duplicaram em menos de cinco anos, pelo que será igualmente uma esperança o aparecimento de novos pomares de abacateiros em MPB (modo de produção biológico).

Para lá de poucos operadores privados especializados no comércio do abacate no Algarve, há a destacar o importante papel que a Frusoal – Frutas do Sotavento do Algarve assume, ao dar passos mais sólidos como organização de produtores também no Abacate, seguindo porventura o exemplo da cooperativa espanhola, que exporta o abacate algarvio para todo o mundo. A agricultura algarvia está a viver um dos períodos mais favoráveis das últimas décadas, nada havendo a temer se forem trilhados caminhos de sustentabilidade crescente, acompanhando os mercados de excelência e a preservação ambiental do território», conclui. 

Fonte: Barlavento