FacebookRSS feed

Agrotec

A evolução do setor das pomóideas nos anos recentes

Se a cultura da maçã tem tido uma evolução positiva ao nível da produção na última década, a produção de pera Rocha, a variedade mais comercializada a nível nacional, estabilizou-se, estando a atravessar algumas dificuldades. A Agrotec falou com Domingos dos Santos, presidente da FNOP, e Gonçalo Andrade, presidente da Portugal Fresh, sobre a quebra de produtividade e as tendências para a exportação.

Pomóideas

Domingos dos Santos, presidente da Federação Nacional das Organizações de Produtores de Frutas e Hortícolas (FNOP), reforça que nos últimos anos, «a evolução de algumas variedades de maçã foi muito boa em termos de produção, aumento de área e rentabilidade para os produtores». Em contrapartida, o engenheiro destaca que a situação da pera Rocha tem-se revelado «mais complicada», isto porque «existiu um grande aumento de produção, mas os mercados para onde se exportava o produto entraram em uma situação mais complicada, nomeadamente o Brasil e a Inglaterra, o que tem provocado algumas dificuldades».

Domingos dos Santos acredita que «essas dificuldades vão ser ultrapassadas mas, até à data, o crescimento de produção foi mais positivo para a maçã do que para a pera».

Mais recentemente, segundo dados do Boletim Mensal da Agricultura e Pescas do Instituto Nacional de Estatística (INE) relativo a agosto de 2020, os pomares de macieiras de Trás-os-Montes, responsáveis por cerca de 44% da produção nacional de maçã, sofreram com as condições meteorológicas, que não se revelaram as mais favoráveis na fase da floração e vingamento, originando menos fruto que na campanha anterior.

As precipitações de granizo agravaram este fenómeno, assim como as temperaturas elevadas que se manifestaram julho. No Ribatejo e Oeste, cujos pomares são responsáveis por 43% da maçã nacional, os vingamentos foram melhores, mas existiu uma quebra acentuada após campanha com produção historicamente elevada nas variedades mais importantes, como a Fuji e grupo das Galas.

Globalmente estão previstas 19,5 toneladas por hectare, o que corresponde a uma diminuição de 20%, face a 2019, e de 8%, face à média dos últimos cinco anos.

Quanto à pera, concentrada no Oeste, a campanha é, também, marcada por fracos e irregulares vingamentos. O fruto sofreu com a baixa qualidade dos gomos florais e a heterogeneidade de abrolhamento, bem como com a precipitação que ocorreu ao longo da floração, que levou a uma menor polinização.

Estima-se uma carência muito significativa da produtividade desta cultura, que deverá diminuir de 30% a 40% face à campanha anterior, para as oito toneladas por hectare, o registo mais baixo desde 2003. A ANP afirma que existe uma estimativa de cerca de 130 000 toneladas a colher.

As tendências de exportação

Gonçalo Andrade, presidente da Portugal Fresh – Associação para a Promoção das Frutas, Legumes e Flores de Portugal, conta-nos que, especificamente em relação às pomóideas, no caso da maçã registou-se «um crescimento dos 26 a 27 milhões de euros de exportação, registados em 2016 e 2015, para 39 milhões de euros em 2019».

No primeiro trimestre de 2020, o setor exportou 13,8 milhões de euros face a 6,8 milhões de euros em 2019, o que consiste num aumento de 103%. «Em 2020, seguramente que teremos um novo recorde no valor das exportações da maçã», acredita. J

á o valor de exportação da pera nacional, nos últimos cinco anos, tem variado entre os 70 milhões de euros, registados em 2016, e os 93 milhões de euros, registados em 2017. No último ano, o valor das exportações foi de 81 milhões de euros.

«No primeiro trimestre de 2020, o valor de exportação da pera cresceu 18,1% face a 2019, o que leva a estimar um crescimento do valor das exportações em 2020», aponta. «Devido às colheitas em agosto e setembro, e ao quarto trimestre ter um enorme peso no valor total das exportações, só depois das colheitas teremos uma noção mais exacta desta estimativa de crescimento », destaca.

Sobre os mercados mais adequados para a exportação das culturas, Gonçalo Andrade evidencia a importância dos países da União Europeia (UE), que em 2019 «receberam 58% do valor exportado pelas peras», enquanto 42% seguiu para países terceiros.

«O Brasil é o principal mercado, seguido do Reino Unido, França, Alemanha e Espanha », explica. No caso da maçã as exportações entre países terceiros e países da UE, em 2019, foi muito equilibrada.«51% para a UE e 49% para países terceiros», evidencia. Espanha, Brasil, Reino Unido, Cabo Verde, Colômbia, Holanda, Emirados Árabes Unidos, Angola e Irlanda foram os principais mercados. «Também na Índia e na Nigéria foi possível degustar as fantásticas maçãs portuguesas o que demonstra o enorme dinamismo deste setor», salienta.

Já sobre a pera Rocha, Domingos dos Santos acredita que o setor saberá «criar novos mercados e adaptar-se na qualidade e às novas exigências». O presidente da FNOP destacou, também, «a janela de oportunidade de exportação muito positiva enquanto país» para a maçã, muito devido à nossa «localização, mais a sul no hemisfério norte, e o facto de termos frutos com boa produção, bom sabor, boa cor, entre outras características».

O potencial das variedades regionais

Embora existam outras hipóteses, a produção está concentrada num conjunto de variedades mais estimuladas. O presidente da FNOP não acredita que o estímulo à produção de outras variedades para a massificação seja o caminho a seguir.

«Do ponto de vista teórico, seria interessante estimular a comercialização de outras variedades de maçã. Do ponto de vista do mercado, já é mais difícil», começa por explicar. «Em situações de nicho de mercado, faz todo o sentido, deve ser estimulado esse consumo. Contudo, se começarmos a ter como objetivo a massificação da venda dessas variedades, deixa de existir viabilidade, pois o mercado não absorve frutos que são desconhecidos».

Domingos dos Santos acredita que «temos muitas variedades, não só de maçã, mas também de pera, que, de facto, funcionam em nichos de mercado». Gonçalo Andrade vai de encontro a esta linha de pensamento, salientando que «para alguns mercados, é importante ter alternativas e por isso há sempre espaço para outras variedades».

Estratégia nacional para a fileira hortofrutícola

No início do ano, o Centro Operativo Tecnológico Hortofrutícola Nacional (COTHN), a FNOP e a Portugal Fresh apresentaram ao Ministério da Agricultura a Estratégia Nacional para a Fileira Hortofrutícola. Agora, devido à situação de pandemia que o globo atravessa, os dirigentes das entidades admitem alterações às prioridades estabelecidas no documento.

«O país, a UE e o mundo atravessam um contexto complexo, desafiante e nunca anteriormente vivido», explica o presidente da Portugal Fresh. «Os mercados estão diferentes, os comportamentos dos consumidores foram alterados e, por isso, também precisamos de rever e atualizar algumas das medidas e metas propostas».

Domingo dos Santos acrescenta que «a estratégia vai sofrer alterações, mais no âmbito de adaptações, brevemente, quando for realizada a reavaliação». Sobre a altura que se vive, o presidente da FNOP realça que «os produtores estão, obrigatoriamente, a adaptar-se à situação. Estamos a enfrentar dificuldades, aumento de custos, aumento de cargas burocráticas, mas temos que nos adaptar», destacando que a FNOP, «enquanto organização socioprofissional, tem realizado todo o trabalho de parceria com os produtores e com a administração.

Estamos a tentar adaptar os processos à nossa realidade. Esta é uma obrigação da FNOP, criar harmonia com o Estado». O dirigente da FNOP conclui a «passar a mensagem de que temos que privilegiar o que é nosso».

Segundo o próprio, «é fundamental privilegiar a produção nacional. As cadeias de supermercados, os mercados, os consumidores. É fundamental no momento difícil que vivemos. Os consumidores não sofreram o aumento de custos que têm surgido no processo e, se apoiarem a produção nacional, já se estará a fazer muito pelo setor agrícola nacional».

Artigo originalmente publicado na Agrotec 36