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Agrotec

«A Agroglobal foi uma aposta ganha pela fileira agrícola nacional» Entrevista a Joaquim Pedro Torres

O mundo agrícola reúne-se de novo em Valada do Ribatejo, de 7 a 9 de setembro de 2021, para conhecer o que de mais moderno se pratica na agricultura portuguesa. Joaquim Pedro Torres, agricultor, Diretor-geral da Valinveste e da Agroglobal, fala, nesta entrevista exclusiva à AGROTEC, da edição deste ano do certame que é atualmente o maior congresso agrícola da Europa a céu aberto.


Entrevista
Marta Caeiro Fotografias Agroglobal e Revista Agrotec

AGROTEC: Quais são as expectativas para a Agroglobal 2021?
JOAQUIM PEDRO TORRES: Elevadas. Quem diria quando há uns meses atrás decidimos, nós e um numeroso conjunto de empresas que participam nos ensaios de campo, avançar com os preparativos desta Agroglobal, numa altura de muitas dúvidas, que chegaríamos ao dia de hoje com mais expositores do que na anterior edição e com o entusiasmo de sempre. Será um reencontro presencial de todo um setor mobilizado para fazer mais e melhor e com muito para comunicar tendo em conta este interregno forçado.

AG: Que novidades destacaria nesta edição?
JPT:
Em termos do espaço aumentámos a área relvada e, pormenor importante, foi possível construir mais um acesso ao parque de estacionamento que, esperemos, descongestione um pouco o trânsito. Teremos um segundo Centro de Negócio pois são muitas as empresas que querem reunir internamente e/ou com clientes. Tínhamos mais pedidos de salas de reunião, mas no layout da feira já não era possível. Algumas empresas têm auditórios nos seus stands. Refiro esta situação por ser um exemplo das muitas dinâmicas da Agroglobal em que cada empresa constrói o seu próprio evento. Serão elas sem dúvida as portadoras das principais novidades. Podemos avançar, desde já, os temas que levaremos aos auditórios, decidido sem conjunto com vários participantes.

«Não se vai à Agroglobal ver o que há de novo, mas sim criar algo novo»

Falaremos de vários sistemas de produção como a vinha/vinho – este ano com uma presença bem mais forte impulsionada pela ViniPortugal, IVV e Andovi – o Olival e Frutos secos com a Olivum e a APFS, o arroz com a Casa do Arroz e o EU rice Consortium, a floresta com a Celpa, os cerais com o parceiro de sempre, a Anpromis, e as frutas e legumes, é claro, com a Portugalfresh. Foi preciosa a ajuda da Consulai e da Agroges. Mas debateremos também temas mais globais como a Economia Circular, a reforma da PAC, a Água e a Inovação com intervenientes de reconhecida capacidade e, como sempre, ouvindo opinion makers que, apesar de não serem especialistas do setor, trarão ideias e apercebem-se do muito de positivo que se faz na nossa agricultura. Este trabalho é muito importante pois é preciso transmitir à sociedade em geral a emergência de produzir alimentos num planeta em acelerado crescimento demográfico e em que a cada momento, morrem pessoas à fome. Isso é muitas vezes esquecido pelos adeptos de uma agroecologia fundamentalista que faz por esquecer todo um mundo produtivo que existe por detrás da prateleira do supermercado.

AG: A Agroglobal sempre desejou que o certame decorresse num ambiente de partilha de conhecimento agrícola e que os negócios estivessem na primei- ra linha. Este espírito mantém-se?
JPT: Mantem-se e é hoje o ADN da Agroglobal. O “motor” da Agroglobal é a partilha de conhecimento, a transferência de know-how, não apenas como pretexto para uma conversa interessante, mas como base de negócio e de criação de valor. Uma nova solução encontrada, uma ideia diferente são, quase sempre, “rastilho” para inovação nos métodos e estratégias e, em sequência, para o aparecimento de novas necessidades para os quais há, quase sempre, resposta na Agroglobal. Isto, pelo menos por enquanto, o virtual não nos traz e assim aqueles três dias em Valado do Ribatejo são de intenso trabalho e o agronegócio vai ao rubro. Não se vai à Agroglobal ver o que há de novo, mas sim criar algo novo! Da mesma forma pretendemos que os debates não visem demonstrar apenas a eloquência ou o mérito teórico dos oradores. Têm como objetivo ajudar a identificar as nossas limitações setoriais e a forma de as ultrapassar no plano nacional e empresarial. Apelamos ao pragmatismo evitando a definição de objetivos utópicos que são muitas vezes um excelente “escudo” para nada fazer.

AG: Que diferenças encontra entre a primeira edição e a atualidade? Que caminhos percorreu a feira em termos de crescimento?
JPT:
A Agroglobal mantém-se fiel à sua personalidade. Um evento profissional e dinâmico com o objetivo de ajudar à melhoria dos desempenhos agrícolas. Há 12 anos atrás fomos um conjunto de empresas agrícolas que não se reviam totalmente nos certames agrícolas tradicionais. Que sentiam necessidade de se afirmar como um setor profissional e tecnologicamente avançado. 

«É preciso transmitir à sociedade em geral a emergência de produzir alimentos num planeta em acelerado crescimento demográfico»

Construímos com os expositores uma forma de trabalho que não é uma simples relação cliente fornecedor. É sempre um longo e enriquecedor trabalho de definição de objetivos e avaliação de estratégias. Hoje temos uma “cidade da agricultura” com todos os setores representados pelas suas empresas mais importantes, onde as novas tecnologistas coexistem com o saber ancestral de gerações de agricultores, presente em todos e cada um dos visitantes. Não é muito arriscado dizer que neste espaço está a resposta para qualquer questão agrícola. Aqui chegados, com a esmagadora maioria do nosso setor agrícola presente, com importantes passos dados no sentido da internacionalização, outras metas se poderão traçar rumo a uma grande feira da Agricultura do Sul da Europa. Esse trabalho foi dificultado pelo Covid mas não está esquecido.

«O “motor” da Agroglobal é a partilha de conhecimento, a transferência de know-how»

AG: De que forma a Agroglobal mudou e continua a mudar a agricultura portuguesa?
JPT: A Agroglobal foi uma aposta ganha pela fileira agrícola nacional. Agricultores e empresas associaram-se para uma demonstração inédita das capacidades e potencialidades de um setor, por vezes olhado pela sociedade como o parente pobre da nossa economia. A opinião que a sociedade, em geral, tem da agricultura portuguesa melhorou desde 2009, quan- do nasceu este projeto. Os agricultores e todo o setor foram reconhecidos e valorizados. Hoje estão sujeitos a outro tipo de pressões. A relação agricultura ambiente é minuciosamente escrutinada pela opinião pública. Pouco se fala noutros setores bem mais poluentes e com menos importância na nossa vida. Nem a qualidade do ar, com a agricultura em pleno, no epicentro da pandemia foi suficiente para rever critérios. Os produtores estão conscientes das suas responsabilidades, buscam permanentemente a melhoria da eficiência na utilização dos recursos, até porque isso é uma exigência dos mercados competitivos, utilizam as substâncias ativas seguras. Somos líderes mundiais nos cuidados ambientais. Esta pressão terá que aliviar mais cedo ou mais tarde e espero bem que não seja por motivos de força maior. A Agroglobal continuará o seu trabalho mostrando uma dimensão tecnológica e profissional da agricultura que a muitos surpreende. Aproximar os media e o poder político ao setor,  aproximar também mais empresas, investidores, novas “cabeças” e novas ideias criando uma espiral de crescimento com resultados à vista e que tem ainda muito para dar. Vamos querer continuar na primeira linha deste movimento reforçando um “espírito Agroglobal” em que agricultores e as suas organizações, empresas ou organismos oficiais constituem um verdadeiro bloco motivado, unido e orgulhoso pela sua quota-parte nos bons desempenhos da agricultura portuguesa.

«Neste espaço está a resposta para qualquer questão agrícola»

AG: Ao nível da tecnologia e agricultura de precisão, o que podem os agricultores encontrar na Agroglobal?
JPT: As exigências dos mercados muito concorrenciais obrigam-nos a utilizar todos os argumentos que possam con-tribuir para uma melhoria de resultados. Por isso a nossa agricultura está e estará cada vez mais “precisa” na utilização dos recursos. A isso nos ajudam as empresas presentes e é pela sua mão e resultado do seu investimento em ID que encontramos o que de mais moderno está disponível para o setor agrícola. Equipamentos mais eficazes e inteligentes, monotorização das culturas, dos solos, da água, dos fertilizantes, robótica, entre outros. O conhecimento científico “debita” a todo o momento novas equipamentos, produtos e tecnologias a um ritmo muito rápido. Concentra-mos os mais impactantes no Agro-Inov, um pavilhão de referência na Agroglobal.

AG: Em que áreas estamos mais e menos avançados?
JPT: Tem-se feito muita coisa boa no nosso país. Temos agricultores e orga- nizações do melhor nível em todos os setores e empresas das mais diversas es- pecialidades, com enorme capacidade. Não parece certo dizer que haja áreas de atividade em que estamos mais avança- dos que outras. Há produções mais “na crista da onda” como o olival, os frutos secos, outras frutas e legumes, a vinha... Mas temos excelentes empresas em todas as áreas, mesmo nas menos intensivas, e não devemos esquecer que “a melhor vaca não é a que dá mais leite, mas sim mais rendimento”. Mas há muito para fazer. Temos áreas com muita margem de melhoria, algumas até que não são um exclusivo da agricultu- ra. Estado e empresas precisam de se unir em torno dos objetivos produtivos. Quer ao nível de projetos individuais, quer públicos. O espírito de equipa não existe, o que representa um enorme desperdício de energias e desaproveitamento de capacidades. Precisamos também de comunicar melhor o conhecimento agrícola. É obrigatório aproximar a comunidade científica, académica e agricultores. As duas partes têm de fazer um esforço de aproximação, pois daí resultariam certamente muitos benefícios. A procura de novas tecnologias não pode parar, mas também é importante fazer chegar de forma clara e simples ao “campo” todo o “capital” já existente. Temos pouco investimento pú- blico no setor que mais poderia fazer para a construção de um país diferente, a agricultura. No PRR e no PNI não consta nenhuma obra relevante, vá-se lá perceber porquê. Nem um exemplo como o Alqueva foi suficiente para demonstrar que é essencial investir na água e no sol, os nossos mais importantes recursos naturais. As pretensas preocupações com as alterações climáticas e transição energética também não nos mobilizaram para evitar o desperdício daqueles recursos. Não podemos pensar que outros resolverão as crescentes necessidades alimentares. Que o autoabastecimento e uma reserva estratégica de alimentos serão resolvidos pela livre circulação de mercadorias. Que os incêndios ficarão resolvidos com as cabras sapadores e as brigadas de limpeza. Que o desequilíbrio entre o litoral e o interior é uma fatalidade nacional. Parecia simples, mas é tão difícil fazer simples.

«Precisamos de comunicar melhor o conhecimento agrícola»

AG: Por fim, uma mensagem para o setor e para a Agroglobal 2021.
JPT: Reencontramo-nos em Valada do Ribatejo a 7, 8 e 9 de setembro, se necessário com certificado digital ou teste porque a fileira agrícola não vai baixar os braços, quer produzir mais e com mais valor acrescentado e por isso falará a uma só voz.

Nota de Redação:

Artigo publicado na edição n.º 40 da Revista AGROTEC, no âmbito do dossier SOLOS: Que práticas visam mais sustentabilidade? .

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