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Agrotec

Estévia: Adoçante Natural

Artigo Técnico

estevia-adocante natural

O aparecimento de problemas nutricionais/médicos, como a obesidade, diabetes e doenças cardiovasculares, devido ao aumento do consumo de açúcar, levou à procura de substitutos menos calóricos por parte da indústria alimentar (Periche, Castelló, Heredia, & Escriche, 2015; Puri, Sharma, & Tiwari, 2011). Atualmente, os adoçantes sintéticos ocupam a maior parte do mercado, como, por exemplo, o aspartame, neotame, sacarina e o sucralose mas, devido a estes compostos não darem um sabor real de açúcar e representarem um potencial risco de cancro (associado ao uso intensivo de sacarina) e não serem recomendados a pessoas com doenças metabólicas (associado ao aspartame), os compostos adoçantes e pouco calóricos disponíveis na natureza começaram a despertar interesse (Puri et al., 2011).
A Stevia rebaudiana (família das Asteraceae) é um dos 154 membros do género Stevia. Esta planta é nativa do Paraguai, onde as folhas de estévia foram usadas como adoçante durante séculos pelas tribos indígenas da América do Sul sendo que o poder adoçante se deve à presença de compostos ativos conhecidos como glicosideos de esteviol (Madan, Ahmad, & Singh, 2010).

Folhas de stevia

figura-2-estevia

Estes compostos são um novo tipo de adoçante natural, os quais contêm vários glicosídeos diterpenos, como rebaudiosideo A, esteviosideo, rebaudiosideo C e dulcosideo A, sendo o esteviosideo e o rabaudiosideo A os glicosideos de esteviol maioritários em Stevia rebaudiana. (Ba, Zhang, Yao, Ma, & Wang, 2014; Khalil, Zamir, & Ahmad, 2014; Periche et al., 2015).

Estudos efetuados sobre os glicosídeos de esteviol demonstraram que estes não são absorvidos pelos seres humanos, não são genotóxicos ou cancerígenos e não provocam qualquer toxicidade reprodutiva ou de desenvolvimento (Brusick, 2008; Pawar, Krynitsky, & Rader, 2013).

Os glicosídeos de esteviol têm inúmeras aplicações na indústria alimentar e farmacêutica, devido ao seu baixo teor calórico, ao seu poder adoçante (o esteviosideo é 300 vezes mais doce do que a sacarose disponível comercialmente), alta estabilidade e várias atividades biológicas. E o uso de stevia como adoçante está a ser utilizado à escala industrial por grandes corporações da área alimentar (Puri et al., 2011; Ba et al., 2014; Khalil et al., 2014).
No que toca aos procedimentos para a extração destes compostos das folhas de stevia, foram feitos alguns estudos onde se comparou metodologias convencionais e novas metodologias biotecnológicas.

Dentro dos métodos convencionais podemos encontrar abordagens físicas e químicas, as quais são caracterizadas por aquelas que se baseiam em solventes, em troca iónica, em cromatografia de adsorção e em solventes com um agente descorante. Aqui podemos encontrar técnicas como extração de fluido supercrítico (SFE), a qual se baseia em dois passos, nomeadamente extração com CO2 a 200 bar e a 30 ºC seguido de CO2 com um co-solvente (metanol, etanol, e acetona), cromatografia de separação, extração líquida pressurizada, extração pressurizada de água quente (PHWE), extração por microondas (MAE), cromatografia contracorrente de alta velocidade (HSCCC), entre outros (Tabela 1) (Pawar et al., 2013; Puri et al., 2011; Rezende et al., 2004).

Tabela 1. Extração de esteviosideo de Stevia rebaudiana com métodos convencionais (adaptado de Puri et al., 2011)

Método

Rendimento

Tempo de tratamento

Cromatografia de separação

35.3 mg/600 g

24 horas

Extração de fluido supercrítico (SFE)

36.66 mg/g

100 minutos

Extração por microondas (MAE)

21.37 mg/g

20 minutos

Cromatografia contracorrente de alta velocidade (HSCCC)

26 µg/mg

270 minutos

Extração pressurizada de água quente (PHWE)

13.9 mg/g

50 minutos

Extração líquida pressurizada

5.2 %

50 minutos

Ultra-sons

4.2 %

30 minutos

Extração assistida ultra-sónica

43.62 %

32 minutos

Água

4.7 %

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Os métodos convencionais apresentam algumas desvantagens, nomeadamente a impossibilidade do uso de material em estado bruto, a regeneração das colunas de adsorção (soluções alcalinas diluídas) poder afetar as propriedades organoléticas e a qualidade do produto, baixa eficiência de extração, custos de investimento em equipamentos, entre outros (Puri et al., 2011).

Quanto às abordagens biotecnológicas, estas baseiam-se no uso de enzimas para a extração de metabolitos nas plantas. Para além da extração, as enzimas podem também ser usadas na modificação ou síntese de substâncias bio funcionais complexas de origem natural, sendo já usadas noutros casos. Na extração assistida por enzimas, as enzimas hidrolíticas como a celulase e pectinase permitem a degradação da parede celular da planta, fazendo com que os materiais intracelulares estejam mais acessíveis para a extração. No caso da extração enzimática de folhas de stevia, o uso combinado de pectinase, celulase e hemicelulase após a maceração facilita a extração aquosa de esteviosideo, revelando uma maior eficiência na extração (975 µg/mg) em comparação à extração baseada em solventes (Gasmalla, Yang, & Hua, 2014; Puri et al., 2011).
Como referido anteriormente, as enzimas não só podem participar na extração mas também na modificação. No caso do esteviosideo, devido ao sabor amargo, para poder ser aplicado em produtos alimentares este composto tem de sofrer uma transglicosilação enzimática de modo a remover o sabor amargo e aumentar a qualidade do esteviosideo. Na tabela 2 podemos ver algumas dessas enzimas usadas (Gasmalla et al., 2014).

Tabela 2. Conversão de esteviosideo por diferentes enzimas (adaptado de (Gasmalla et al., 2014).

 

Enzima

Fonte da enzima

Rendimento de conversão (%)

Ciclodextrina glucanotransferase

Comercial

77.11

α-Amilase

Bacillus amyloliquefaciens

38.3

β-Ciclodextrina glucanotransferase

Alkalophilic bacillus sp. BL-12

76

Alternansucrase

Leuconostoc citreum SK24.002

43.7

α-Amilase

Aspergillus oryzae

48.2

Ciclodextrina glucanotransferase

Bacillus stearothermophilus B-

5076 B

53

Apesar das vantagens do uso de enzimas, algumas limitações estão presentes, nomeadamente nos custos da aquisição das enzimas para grandes volumes de matéria-prima bruta e na degradação incompleta da parede celular por parte dos preparados de enzimas disponíveis, apesar de dar a oportunidade de promover um aumento na qualidade do produto final (Puri et al., 2011).

Em suma, a utilização de stevia, devido às várias aplicações que possui, tem um grande potencial ainda por explorar. Há dados que indicam que o esteviosideo oferece benefícios terapêuticos, como atividade anti-hiperglicémica e anti-hipertensiva, anti-inflamatória, anti-tumoral, diurética, e efeitos imunomoduladores, apesar de serem precisos mais estudos para avaliar os seus efeitos toxicológicos sobre a saúde humana (Gasmalla et al., 2014). Existem vários métodos físicos e químicos para a extração dos compostos de stevia mas, devido à eficiência da tecnologia enzimática, a produção será mais competitiva, apesar de ainda haver algumas limitações no desenvolvimento de um processo que seja economicamente viável.

Por: Paulo Rodrigues, Biotecnólogo.

Bibliografia:

Ba, J., Zhang, N., Yao, L., Ma, N., & Wang, C. (2014). Separation of Rebaudiana A from Steviol glycoside using a polymeric adsorbent with multi-hydrogen bonding in a non-aqueous system. Journal of Chromatography. B, Analytical Technologies in the Biomedical and Life Sciences, 971, 141–9
Brusick, D. J. (2008). A critical review of the genetic toxicity of steviol and steviol glycosides. Food and Chemical Toxicology : An International Journal Published for the British Industrial Biological Research Association, 46 Suppl 7(7), S83–91
Gasmalla, M. A. a., Yang, R., & Hua, X. (2014). Stevia rebaudiana Bertoni: An alternative Sugar Replacer and Its Application in Food Industry. Food Engineering Reviews, 6(4), 150–162
Khalil, S. A., Zamir, R., & Ahmad, N. (2014). Selection of suitable propagation method for consistent plantlets production in Stevia rebaudiana (Bertoni). Saudi Journal of Biological Sciences, 21(6), 566–73
Madan, S., Ahmad, S., & Singh, G. (2010). Stevia rebaudiana (Bert.) Bertoni-a review. Indian Journal of Natural Products and Resources, 1(September), 267–286
Pawar, R. S., Krynitsky, A. J., & Rader, J. I. (2013). Sweeteners from plants--with emphasis on Stevia rebaudiana (Bertoni) and Siraitia grosvenorii (Swingle). Analytical and Bioanalytical Chemistry, 405(13), 4397–407
Periche, A., Castelló, M. L., Heredia, A., & Escriche, I. (2015). Influence of drying method on steviol glycosides and antioxidants in Stevia rebaudiana leaves. Food Chemistry, 172, 1–6
Puri, M., Sharma, D., & Tiwari, A. K. (2011). Downstream processing of stevioside and its potential applications. Biotechnology Advances, 29(6), 781–91
Rezende, S. L., Bergamasco, R., Camargo, N. R., Machado, F., Marcos, C., Andrade, G., & Maria, R. (2004). Purificação do extrato aquoso de Stevia rebaudiana Bertoni através dos processos com zeólitas e membranas. Acta Scientiarum. Technology, (1), 21–26.