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Agrotec

A estratégia de longo prazo para o regadio em Portugal

  • 10 junho 2020, quarta-feira
  • Rega

Os regantes portugueses, representados pela FENAREG, apontaram caminhos orientadores das políticas públicas de regadio até 2050, e propuseram ações para modernizar o regadio em Portugal, estimando que será necessário investir 1700 milhões de euros no período 2021-2027.

FENAREG

Por: Federação Nacional de Regantes (FENAREG)

No cenário de alterações climáticas, cujos efeitos são já visíveis com períodos de seca cada vez mais frequentes, a agricultura de regadio é uma atividade estratégica para a economia portuguesa, e deve ser encarada como tal pela Sociedade e pelos decisores políticos. A produção de alimentos em quantidade suficiente para suprir as necessidades da população portuguesa e para manter o dinamismo das nossas exportações agroalimentares, depende do regadio.

A FENAREG, entidade que representa mais de 90% do regadio organizado nacional, decidiu dar o seu contributo através de um estudo sólido e fundamentado para uma estratégia que enquadre um caminho a seguir em matéria das políticas públicas de regadio nas próximas décadas. Este estudo faz um diagnóstico estratégico e aponta objetivos a alcançar até 2050, um plano de ação a executar entre 2021-2027 (período do próximo Quadro Comunitário de Apoio) e respetivos cálculos do investimento e a origem do financiamento.

Os sete eixos de desenvolvimento estratégico das políticas públicas de regadio propostos são:  

1. Expandir a área infraestruturada para rega

Criar novas áreas de regadio para mais 250 000 hectares de terrenos agrícolas, metade das quais no interior do país e que atualmente regam com elevado risco de garantia de água. Até 2027 propõe-se a execução de 50 000 hectares, num investimento estimado de 965 milhões de euros. São áreas que, já sendo regadas a partir de captações privadas e de suficiência limitada, passam a beneficiar de infraestrutura pública coletiva, com um grau de segurança de acesso elevado. Além de expansão de redes já existentes, as três novas obras de rega propostas para 2021-2027 são o Crato, o Projeto Tejo e o Planalto Noroeste de Mirandela.

2. Aumentar a capacidade de armazenamento de água e de regularização interanual

Propõe-se o alteamento de algumas barragens que já foram estudadas e a construção de novas barragens nas bacias hidrográficas mais carenciadas do continente, numa abordagem sustentada de fins múltiplos (regadio, abastecimento público e outras atividades económicas) e a ligação em rede entre bacias hidrográficas. O investimento associado a estas intervenções, a maioria estudos, carece de trabalho ainda a ser desenvolvido. A sua dimensão estratégica abrange os diversos usos. Recorde-se que o armazenamento de água em barragens é necessário para a agricultura, mas também é indispensável para abastecer a população. A título de exemplo, Espanha calcula que se dependesse em exclusivo da água que corre livremente nos seus rios, apenas 9% da sua população poderia viver e desenvolver atividades económicas no território do país vizinho.

3. Modernizar as infraestruturas públicas de rega

Visando a redução das perdas de água ao longo dos sistemas de armazenamento e distribuição mais antigos, a redução dos custos de operação destes e a melhoria da garantia de fornecimento de água com qualidade aos utilizadores. Identificam-se prioritárias intervenções em construções anteriores a 1990 que não tenham ainda sido objeto de modernização, a capacitação dos quadros técnicos e instrumentos tecnológicos de apoio à gestão. O investimento estimado para o período de 2021-2027 é de 437 milhões de euros.

4. Promover as melhores práticas de rega nas explorações agrícolas

O objetivo é aumentar a eficiência no uso da água e da energia pelos agricultores regantes, através da criação de apoios para adoção de tecnologias de rega de precisão. As metas a atingir até 2050 incluem a reconversão de 200 000 hectares para sistemas de rega mais eficientes, a adoção de práticas de agricultura de precisão em pelo menos 50 % da área e a redução do peso médio da energia no custo de cada m3 de água para um máximo de 30%, com instalação de sistemas de energias renováveis e adequação do regime de potência. O investimento estimado até 2027 é de 225 milhões de euros.

5. Reforçar a sustentabilidade ambiental do regadio

Propõe-se o desenvolvimento, em colaboração com o Ministério da Agricultura e o Ministério do Ambiente, de uma norma para o reconhecimento e posterior certificação de “explorações de regadio sustentável”, que incorporem entre outras dimensões a proteção e a gestão dos recursos hídricos, a conservação do solo, o contributo positivo para a biodiversidade (habitats e espécies) e a melhoria da sustentabilidade carbónica. A adoção destas ações contribuirá para a criação de Zonas Agrícolas de Regadio Sustentável. O objetivo é atingir 100 000 hectares certificados até 2027, com um investimento estimado de 10,5 milhões de euros.

6. Compatibilizar instrumentos de ordenamento do território e de conservação da natureza com a expansão das áreas regadas

Um dos objetivos é a criação de “acordos de responsabilidade” entre as entidades gestoras das áreas protegidas/classificadas e os utilizadores da água para rega, prevenindo conflitos e prevendo mecanismos de resolução claros quando eles ocorrem, considerando o contributo dos significativos avanços que a ciência e a tecnologia têm vindo a proporcionar. O levantamento de zonas de sobreposição, revisão de áreas beneficiadas e implementação de mecanismos de compensação, são algumas das ações deste eixo que abrange todos os aproveitamentos hidroagrícolas, com um investimento estimado de 11 milhões de euros.

7. Rever os modelos de tarifários da água e adequar a legislação à nova realidade

Visa a criação de um sistema claro, equilibrado e equitativo dos tarifários associados à utilização de água para rega, premiando os aumentos de eficiência e integrando o valor das externalidades positivas (sociais, territoriais e ambientais) no cálculo do “preço da água” à luz do que define a Lei da Água. A meta a atingir até 2027 é a adequação da legislação à realidade mais complexa que já existe no terreno (e que se deverá aprofundar no futuro) e a revisão dos modelos de tarifários praticados em todos os perímetros de rega públicos. O investimento previsto é de 500 000 euros.

O Programa Nacional de Investimentos 2030, divulgado pelo Governo no início deste ano, estima 750 milhões de euros para investimento em regadio. No entanto, a FENAREG considera que será possível financiar o conjunto de ações propostas na sua Estratégia e atingir as respetivas metas, alargando os instrumentos financeiros a fundos para além do FEADER, nomeadamente ao FEDER, do Fundo Social Europeu, ao Fundo de Coesão, ao Fundo Ambiental, a empréstimos do Banco Europeu para o Investimento, ao Orçamento Geral do Estado e ao investimento privado, articulados numa abordagem multifundos.

A proposta da FENAREG para uma estratégia de longo prazo do regadio em Portugal foi formalmente entregue à Ministra da Agricultura, a 6 de Janeiro de 2020.

No âmbito das negociações sobre a reforma da PAC e dos restantes instrumentos financeiros da União Europeia, Portugal deverá submeter à Comissão Europeia um documento de “Estratégia Nacional”. Sendo o regadio um fator determinante para o sucesso da agricultura no nosso país e para o aumento da coesão do nosso território, não é possível estabelecer uma estratégia para a agricultura portuguesa que não incorpore, à partida, o desenvolvimento futuro das infraestruturas de rega e de todas as matérias que são relevantes para mais e melhor regadio no nosso país.

Para a FENAREG é essencial uma política agrícola orientada para o regadio, geradora de condições de fundo para um desenvolvimento do território rural e crucial à sustentabilidade da produção nacional de alimentos.

O documento integral da proposta pode ser consultado no site da Federação.